domingo, 17 de abril de 2011

Sonhos

Alan era uma pessoa irriquieta e curiosa. Desde criança, sua pergunta favorita era: "Por quê?". Talvez pelo fato de ter sido criado na ausência do pai ou por ter tido um problema com a descoberta sobre o Papai Noel ser uma ficção - este último fato apontado por seu terapeuta como sendo a própria ausência do pai. Anos mais tarde, ele concordara com ele.

Não estranho a seu modus operandi, Alan decidiu ingressar na faculdade de direito para poder descobrir as motivações das pessoas. Dentre defensoria ou promotoria, decidiu pela última: não só pelo fato de poder oferecer a denúncia quando acha-se propício, mas também por poder investigar mais a fundo tudo o que poderia ser afeto ao caso. Escolheu focar na promotoria estadual, uma área na sua visão mais necessitada e que poderia apalatar mais sua necessidade pelo saber.

Após alguns anos de formado, ainda em fase de estudo e advogando, conehceu Marcela. Uma linda advogada civilista, a qual conheceu por acaso no Fórum. Algo chamou a sua atenção e decidiu protrair aquela conversa em uma mesa de um café, ali perto. Embora ela não degustasse café, não afastou a possibilidade de pronto - sabia que podia ser má interpretada. Dali, partiram para uma longa conversa na qual deliberaram sobre vários temas do cotidiano.

Até que, inusitadamente, ao colocar mais açúcar em seu café - preferia sempre o de bule, detestando os de máquina - esbarrou seus dedos nos de Marcela. Uma estranha sensação percorreu o corpo dos dois, um choque, como eles diriam. Um interessado da área de neurologia diria que os processos de neurotransmissão cerebral aumentaram em quantidades alucinantes, acionando principalmente o centro límbico de ambos.

Passaram semanas de paixão intensa, com troca de mensagens fervorosas. O dia de um era pensar no outro, enquanto resolviam seu cotidiano. Cada um gostava de preparar uma surpresa romântica em seu estilo, para que pudessem agradar o outro. Além disto, quando passavam por um problema, procuravam no outro um abrigo. Ajudava muito aqueles dois seres solitários a ter um alguém; funcionou durante grande parte do relacionamento.

Marcela costumava ligar muito mais do que ele para ela, porém ela diminui isto de maneira abrupta. No início, Alan tentou compensar isso, assumindo este papel, numa forma de mostrar para ela que ele seria o seu companheiro. Foi como gritar no vácuo. Resolveu, então, conversar uma, duas vezes... Em vão. Aparentemente, ela só não mais o queria. Estranhou o acontecido, arguiu que a atitude dela era prematura em virtude de um relacionamento tão promissor. Ela até apontou algumas razões: a maioria externas à relação dos dois. Ela veemente o afastava.

Alan iria começar a apronfundar a conversa, quando foi abruptamente cortado por Marcela. Sentiu-se como quem perde o chão, uma sensação de que o fôlego escapava-lhe de toda uma vez. Aquela mesma sensação de um soco no estômago. Ele, pela primeira vez, não sabia como proceder em sua investigação. Ainda que lhe causasse espécie a atitude de seu ex-objeto de desejo, ele simplesmente acatou. Não poderia fazer mais aquilo que mais gostava.

Aceitou que ela não mais o queria. Sabia que poderia fazer as coisas darem certo, contudo sabia acima de tudo que só poderia fazer isso de comum acordo com Marcela. Suspirou. Todas as pessoas têm limites e cabe a nós respeitá-los, embora estas mesmas pessoas, por vezes, nem sempre entendiam o que estavam ocorrendo com elas. Todavia, trazia Alan uma ínsita certeza: sonhos de casais só poderiam ser sonhados a dois.

Lembrou de Rilke - autor de um livro que marcara sua vida: Cartas a um jovem poeta - e sentiu-se confortado por tudo o que lhe estava acontecendo. "A primavera há de vir..." - dizia Rilke - "... mas só para aqueles que tiverem a paciência para esperar." Centrou-se. Marcela não mais o queria, nem ao menos esperar o inverno do início de relações passar para poderem acalentarem-se na primavera.
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