segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Dos sofrimentos que valem a pena

Thobias chorava em um bar, solitário. Deixava as lágrimas rolarem por seu rosto sofrido com as marcas do tempo. Colocava na balança, entre um chopp e outro, o que tinha perdido na sua vida. Tinha um trabalho pífio, pouco contato com a família e quase nenhuma vida pessoal. A única reunião que ia era a anual do Colégio Pedro II e uma mensal da Autarquia Estadual na qual trabalhara toda a sua vida. Sua pretensão em se formar em direito se esvairia por suas mãos.

Foi quando Helenice apareceu em sua vida. Uma pessoa que conhecera na internet, em uma dessas salas de bate-papo tão comuns para um intimidade restrita e limitada pelo medo dos dois de fisicalizarem aquele encontro. Porém, algo diferente tinha ocorrido entre aquelas duas almas: elas se interessaram mutuamente - ele, pela espontaneidade dela e ela pelo seu senso de humor. Os tipos físicos um pelo outro uma atração indiscritível. Ele adorava o nariz de descendência italiana dela e ela o nariz de descendência árabe dele. Resolveram, então, após alguns dias de bate-papo e telefonemas, jantarem.

Foi indescritível o que ocorrera naquela mágica noite: atração à primeira vista, amor em algumas semanas. Atracavam-se sempre que podiam, de uma maneira pagã e longa. Exauriam-se de tanto se amarem. Discutiam planos e imaginavam filhos, um sempre puxando alguma característica de sua família, um pouco para implicar de uma maneira sadia com o outro e um pouco para, logo após, fazer preferência pelo outro. Levavam assim o relacionamento deles.

Ele havia decidido pedi-la em casamento. Seria entregando o anel para ela, no mesmo restaurante no qual tinha comparecido a primeira vez. Ele iria pedir para que ela olhasse para trás e, dentro da rosa vermelha, lá estaria o anel de noivado. Seria a coisa mais romântica que alguém teria feito por ela, que na altura de seus quase trinta e cinco nunca tinha recebido uma rosa sequer em um relacionamento afetivo. Nunca, em sua vida, Helenice havia experimentado o que tinha com Thobias. Era um amor de novela.

Ao chegarem no restaurante, Thobias estava nervoso. Ao entregar o anel, fez sua amada se debulhar em lágrimas. Saíram dali rapidamente para a casa dela. Depois de uma madrugada inteira acordados, dormiram abraçados com o nascer do sol. Naquela mesma semana, já se procediam planos. Thobias a encontrou na loja de móveis planejados para poderem mobiliar um apartamento pequeno que ele tinha comprado. Ambos venderiam seus imóveis maiores para poderem investir no futuro.

Foi quando ela desmaiou. Desesperado, levou-a no hospital. O pior aconteceu: foi diagnosticado um tumor irreversível no cerebelo. Foi tentado de tudo: quimioterapia, radioterapia, até mesmo terapia de cristais... Mas nada funcinou. Ela pediu que Thobias se afastasse dela. Ele negou. Não abandonaria o amor da vida dele daquele jeito. Fez tudo o que podia: loucuras de amor, tratamentos sérios, aproveitou para realizar todos os sonhos que ela tinha.

Ela faleceu duas semanas depois. A dor que Thobias sentia era maior do que a sua própria existência. Cambaleante e embriagado, sentou na sarjeta. Observou um cão de rua passar e afagar-se em sua perna. Ele deixou. Ao menos, abreviaria o sofrimento de algum ser. Suas lágrimas vertiam por seu rosto. Tinha tido o seu grande amor por tempo curto demais. Algo tão pelo e tão puro escapou-lhe por entre os dedos. Sentia-se ludibriado pelo destino Sentiu-se um joguete na mãos dos deuses, imaginou-os rindo do alto de seus palecetes, apontando para o trôpego mortal.

Sabia que tinha dado para Helenice mais do que ela poderia ter de qualquer homem. Percebeu-se da finitude de todos os momentos pelos quais passamos, do quanto deixou deperdiçar a sua vida com pequenas coisas, picunhas sem sentido; iria procurar reaver o que havia deixado para trás. Aproveitou tudo o que poderia ter aproveitado com ela e o faria de novo, mesmo sabendo o seu desfecho. O seu amor por ela era maior do que o seu sofrimento.

Agradeceu a Deus por tê-la encontrado - levaria-a para sempre no seu coração. Ele, ao menos uma vez, havia amado uma pessoa de verdade, sem que ela nem ele usassem máscaras. Trocaria de lugar com ele, tal era o seu prezar por ela. Ele definira o que ela era para ele; amor verdadeiro. Ele iria imortalizá-la em um texto, para que sempre ela pudesse ser lembrada e por todos conhecida. Ele contaria a história de amor dos dois para o mundo. Seria o seu presente para ela. Uma obra de amor.

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